Everalda: Personalidade folclórica do desfile da Independência

7 de setembro de 2016 - 00:53, por Marcos Peris

Portal Lagarto Notícias

Há 25 anos, a popular Everalda, de 67 anos, se apresenta nas comemorações do 7 de setembro em Lagarto. A data que comemora a independência do Brasil é para ela o dia mais importante e aguardado do ano.

Everalda, a Rainha do Folclore

Everalda a Rainha do Folclore

“Enquanto Deus me der vida, saúde e coragem, da avenida eu não saio. (…) Eu desfilo por amor ao povo lagartense porque, quando eles me vêm na avenida, são os primeiros a gritarem e a aplaudirem”, explica Everalda.

Entretanto, Everalda nem sempre desfilou sozinha. Ela começou desfilando junto ao finado Maninho de Zilá, depois acompanhou o grupo da saudosa Soledade de seu Juca Alfaiate, até desembarcar na Quadrilha Buscapé, onde passou apenas quatro anos e abandonou por se sentir desvalorizada.

“Eu era a mais velha do grupo, não fazia questão de nada, e eles me colocaram para trás e os jovens na frente. Daí eu vi que eles não me davam mais atenção e resolvi desfilar sozinha”, relembrou Everalda, a qual promete desfilar em 2016 com um traje de cores vermelho e preto e como “uma baiana muito doida”.

Durante a breve entrevista que concedeu a este portal, a Rainha do Folclore de Lagarto comentou que se prepara para o desfile cívico feito as escolas de samba do Rio de Janeiro, e que os trajes são frutos de sonhos que ela tem durante as noites. Questionada sobre o gasto com as fantasias, Everalda argumenta que alguns populares a procuram para patrociná-la apesar dos tempos de crise.

“Quem me conhece sabe que eu entro na avenida para valer. Então não preciso pedir dinheiro, as vezes o povo mesmo me dá o patrocínio, mas se depender dos políticos… alguns prefeitos já me ajudaram, uns me davam R$ 500,00, outros R$ 400,00, ai apareceu a crise e agora veio apenas R$ 100,00. Acabou com a bicha (risadas), mas pior é nada.”, disse Everalda.

Rainha do Folclore – Ainda durante a entrevista, Everalda comentou que o título de Rainha do Folclore lhe foi concedido pelo poeta Adalberto Fonseca, o qual sempre a via com um alto astral e sendo aplaudida pelo público, “ai ficou”. Mas ela começou a sua trajetória no circo e seu primeiro adjetivo, quando rombeira, foi Casinha Branca da Serra.

A fantasia preferida de Everalda é a de Carmem Miranda (Foto: Arquivo pessoal)

A fantasia preferida de Everalda é a de Carmem Miranda (Foto: Arquivo pessoal)

Rotina – Everalda costuma dormir durante a madrugada – por volta da 00h -, acorda cedo e trabalha de segunda a sábado como diarista, em cada serviço ganha a quantia de R$ 80,00. Já os domingos são reservados à sua casa, a qual demonstra ter o maior zelo, tanto que disse não querer ter filhos – mesmo se pudesse – pois estes “bagunçariam tudo”.

Mesmo aos 67 anos, ela costuma andar de salto plataforma e cheia de bijuterias, porém durante as festividades desta quarta-feira (7), a mesma desfilará com um calçado rasteiro, por recomendação médica, devido a algumas dores que sente na coluna.

Ainda no seu dia-a-dia, Everalda combate o diabetes que contraiu há três anos tomando três comprimidos diários e alguns chás. Além disso, ela usa um colírio para combater o Glaucoma e namora um rapaz que a visita alguns dias durante o mês.

Preconceitos – Rinaldo Silva Santos, a Everalda, nasceu no Alto da Gata em Lagarto, e desde os 10 anos se veste como mulher. Na época apenas recebeu o apoio e o nome de Everalda da sua saudosa mãe, a qual teve dois filhos homens mas que queria ter uma filha mulher. “Por isso que eu cuidei muito bem da minha mãe e a coloquei no meu lindo mausoléu”, acrescentou a diarista.

Contudo, aos 12 anos ela foi estuprada pelo seu padrinho. “Naquele tempo a minha mãe mandava eu acompanhar meu padrinho, daí um dia ele me levou para um lugar longe e me estuprou. Na hora um galho soltou, e a veia do meu reto estourou, quando me levaram pro hospital, ele disse que tinha sido uma cobra que tinha picado, mas o médico logo descobriu que se tratava de um estupro. Mas ele ficou do meu lado e prometeu que moraria comigo, e de fato ele morou por cinco anos. Se fosse hoje, ele pegaria uma cadeia miserável”, recordou-a.

Everalda passou por uma cirurgia para mudar de sexo há 10 anos, aquele foi o ano mais triste para ela porque não pôde desfilar no 7 de setembro. “Se disser que vai chegar setembro e eu não vou desfilar, é uma tristeza que me dá. Quando me operei, eu não desfilei. Achei que ia morrer.”, falou a transexual.

Contudo, ela ainda não compreende porque a sociedade a olha com os mesmos olhos de antigamente. “A sociedade ainda me ver com descriminação, eu nunca vesti roupa de homem, eu só me visto de mulher. O povo me ver assim há 67 e ainda fica assombrado”, comenta.

Sonhos – Apesar de só enxergar apenas por um olho, ter perdido dois dedos durante uma descarga elétrica sofrida enquanto trabalhava no Palácio do Governo da Bahia e ter contraído o diabetes há três anos, Everalda ainda sonha em desfilar como porta-bandeira.

“Eu quero tanto desfilar de porta-bandeira, mas fui olhar o preço da fantasia na internet e vi que custa em torno de R$ 2.000,00. Tomara que algum amigo meu mande uma carta para a Eliana ou pro Geraldo Luiz e eu consiga realizar esse sonho de entrar na avenida como porta bandeira”, disse a esperançosa.

Everalda também sonha em ter um funeral típico dos grandes chefes de Estado. Para realizar tal façanha, ela doou a sua casa em troca de um mausoléu – feito ao seu gosto – no Cemitério Senhor do Bomfim. Questionada sobre a cerimonia, ela disse que já tem tudo pronto, que o caixão já foi comprado, que a Lira Popular de Lagarto tocará e que não quer flores no caixão, porém deseja que todos estejam alegres e sorrindo.

Ela também destacou que quer que um avião de guerra jogue flores durante o seu velório. “Vou deixar uns R$ 10 ou R$ 30 mil na mão de uma pessoa para ver se ela bota esse avião para detonar”, adiantou Everalda.

A Rainha do Folclore já foi roceira, rombeira, lavadeira, vendedora de picolé e padeira, mas pretende continuar trabalhando até seus últimos dias, pois acredita que não será feliz após a aposentadoria. Uma reportagem não é capaz de contar toda a vida desta figura da cultura lagartense, pois como ela mesma diz: “a minha história é longa”, finalizou Everalda.

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