UM GESTO RADICAL DE DOAÇÃO

2 de abril de 2021 - 10:10, por Claudefranklin Monteiro

Itabuna vai guardar mais uma enxurrada de emoção com “Paixão de Cristo” -  Diário Bahia
Paixão de Cristo (direção de Marco Nô – Itabuna-BA)

             A Sexta-Feira Santa sempre exerceu sobre mim um profundo fascínio desde a mais tenra idade. Com meu saudoso tio, Antônio Carlos dos Santos (Tonho de Sinhô), sacristão da Paróquia Nossa Senhora da Piedade, acompanhava de perto e nos bastidores todos os preparativos do Ato da Paixão, das 15 horas. Ver a imagem de Jesus Morto sendo depositada no andor, era sempre algo novo e embora soubesse que ali era apenas arte, meu coração se enchia de compaixão.

            Com meu irmão, José Cláudio Monteiro, não perdia uma única solenidade, das que eram realizadas entre o Domingo de Ramos e o Domingo de Páscoa. Sua ausência, desde aquele ano de 2006, o primeiro sem a sua companhia, até hoje se faz sentir. Se não tivesse aprendido que devemos ter o luto, mas vivermos o luto, não sei se teria superado. Impossível ver o sacerdote entrar em silêncio no Santuário de Nossa Senhora da Piedade, prostrar-se no altar e não lembrar dele, que enchia os olhos de lágrimas naquele instante que faz o mundo inteiro calar por alguns minutos.

            Com o tempo, fui compreendendo melhor o que representava aquele momento e da necessidade que todos temos de imitar radicalmente Jesus Cristo, entender seu sofrimento na hora de sua doação sem medida, paciente, pura e ao mesmo tempo causa de contradição para muitos até hoje. O filho de Deus, “derrotado” numa humilhante morte e morte de cruz. A mais abjeta de todos para aquela época.

            Assim como muitos que resolveram imitá-lo, o Ato me impelia a passar da vida contemplativa para a vida ativa. De oração, também, mas sobretudo de doação radical, como foram as vidas dos santos. E nessa toada, mergulhar profundamente naquilo que nos faz lembrar o beato Charles  de Foucauld (1858-1916): “O nosso aniquilamento é o meio mais poderoso que temos para nos unirmos a Jesus e para fazermos o bem às almas”.

            Em tempos de pandemia do COVID-19, penso todos os dias em algo que minha mãe, Maria Claudemira sempre me dizia: “Frank, quando a gente adoece, perdemos a vergonha”. Dizia ela, porque tinha um grande pudor quanto ao seu corpo e de repente se via entregue às mãos de médicos, enfermeiras e filhos a cuidarem dela e vez outra, tendo que superar o pudor e despir-se ou ser despedida, para um tratamento, exame ou mesmo banho ou limpeza das parte íntimas que a doença não mais lhe permitia fazer sozinha.

            Cristo, assim como os doentes, os idosos e os incapacitados, da sua prisão à morte na Cruz esteve exatamente assim: despojado por inteiro. Tendo sofrido as piores dores que um ser humano possa suportar. Traído, espancado, humilhado e morto, não reclamou, não esbravejou e não maldisse. Doou-se por inteiro

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