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DIÁRIO DE UMA QUARENTENA (CISNE BRANCO)
23 de maio de 2020 - 10:28, por Claudefranklin Monteiro
Houve um tempo em que se ouvia, em Lagarto, com nitidez, o badalar dos sinos do Santuário de Nossa Senhora da Piedade. Sinos que se eternizaram na poesia de Abelardo Romero Dantas e que pontuavam o cotidiano da cidade. Eu já estava adquirindo a expertise necessária para saber se havia morrido alguém, a marcação da hora e se já era a hora da Ave Maria. Se era festa ou se era chegada a hora para a Missa.
Os sons dominavam a cidade. Dos pardais aos chavões dos vendedores: “olhe o aipim, mole!; “olhe o beiju, molhado” (a vírgula dá o tom da onda que o sujeito tirava). Mas um som, de modo especial, fazia qualquer criança abandonar o que estava fazendo para ir ao seu encontro. Eu morava a poucos metros da Filarmônica Lira Popular de Lagarto. Seus dobrados chegavam à casa de minha mãe sem muita dificuldade. E no mês de setembro, na minha infância, ficava as voltas vendo à banda passar, seja por ocasião da Semana da Pátria, seja por conta do Novenário e Festa de Nossa Senhora da Piedade.
Amava e até hoje mexe comigo as execuções dos dobrados Sílvio Romero e Os Quatro Tenentes, de autoria do maestro José Machado dos Santos. Não foi à toa que ansiava servir o Exército. Em Lagarto, a reserva de um ano se dava no Tiro de Guerra 06/015, onde eu fazia as aulas práticas de Educação Física do Colégio Laudelino Freire e algumas do Colégio Estadual Abelardo Romero Dantas. Minha especialidade: corrida de 100 metros (risos).
Não cheguei a servir. Fui dispensado em razão dos estudos em nível superior, em seus primeiros semestres. Mas de alguma forma, cheguei a cogitar seguir a carreira militar, a exemplo de meu irmão Claudemir Monteiro Santos, atualmente na reserva, após ter atingindo o oficialato entre os Fuzileiros Navais, para meu orgulho e da família.
Ele era um referencial para mim, nesse sentido, dado que eu conseguida entender, por meio de sua história de vida o real sentido do patriotismo e a função constitucional das Forças Armadas, em que pesem as minhas reservas pessoais, políticas e históricas sobre o período da História do Brasil, compreendido entre os anos 1964 e 1985.
Claudemir partiu para Salvador-BA, a fim de se alistar entre os Fuzileiros Navais, antes mesmo de completar 18 anos. Teve que amadurecer à fórceps, depois de uma adolescência tensa e intensa, sobretudo como aluno no Colégio das Freiras, em Lagarto. Irmã da Anunciação que o diga. Bom de briga e namorador, ajudava nosso pai no bar, mas queria mesmo era fazer a sua história pelo mundo. Encarar a vida na marra e no murro e vencê-la, superando inúmeras dificuldades e reveses.
Hoje, ciente de sua vitória, ele, nosso amado Comandante, vive em Maricá, região praieira do Rio de Janeiro, ao lado de sua esposa Socorro. Seus quatro filhos (três deles militares), Alejandro, Joseph, Patrícia e Daniel, estão todos criados. Colhe o amor dos netos com a consciência do dever cumprido e segue levando adiante as lições que aprendeu em casa e com as Forças Armadas.
No Curso de Licenciatura em História da Universidade Federal de Sergipe, nos anos 90, desenvolvi sob a orientação da Profª. Drª. Terezinha Oliva, uma pesquisa para compreender a relação entre nacionalismo e identidade nacional. E o fiz a partir da obra do médico e educador sergipano Manoel Bomfim (1868-1932). Na utopia nacionalista de Bomfim, a gênese do Brasil República a partir da ideia do “ânimo nacional”, tão distorcido em nosso tempo, no afã de atender a um propósito ideológico e não à uma ideia de nação multifacetada e promissora, como queria e entendia ser o melhor para o país aquele escritor.
Na história de vida de meu irmão e no espírito de camaradagem e respeito que predominam entre seus pares, sobretudo nas reuniões de confraternização que ele faz entre seus ex-alunos e comandados, geralmente em Salvador (onde ele foi instrutor por muitos anos consigo) vislumbrar as qualidades das Forças Armadas. Mormente no que os hinos pátrios e os dobrados que eu apreciava em minha infância propagavam, muito distante de alguns maus exemplos atuais da vida pública, que flertam perigosamente com os limites impostos constitucionalmente e democraticamente, limites conquistados e sacramentados desde 1988.