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DIÁRIO DE UMA QUARENTENA (NA TOADA DA VIDA)
21 de maio de 2020 - 00:01, por Claudefranklin Monteiro
Dezembro de 2006, ela estava aflita porque seu leito secou. Maria Cláudia havia nascido poucos meses depois da chegada de Pedro Franklin. Patrícia ainda estava amamentando e produzia com profusão e a amamentou, para a emoção e alegria de todos. A cena jamais teria acontecido, não fosse, anos antes, a vontade de viver de minha irmã, Claudiane Monteiro, a quem dedico essa crônica.
Depois de uma adolescência às voltas com a necessidade de se afirmar profissionalmente e como mulher, ela experimentou uma série de dramas que por um fio não tiveram um desfecho fatal. Sentado no corredor que dava acesso ao centro cirúrgico do Hospital João Alves Filho (à época), esgotado fisicamente e quebrado em pedaços emocionalmente, a médica me fez a seguinte pergunta: “você tem fé?”, no que a respondi que sim, convicto. Tecnicamente, minha irmã tinha cinco por cento de chances de sobreviver.
Ela, embora inconsciente, se agarrou a cada esperança. Depois de uma peregrinação entre o João Alves e o Cirurgia, dias de recuperação lenta, superando as apostas de desengano, enfim recobrou-se e aquela pessimista estatística não encontrou alento. Vitória da fé e da ciência, da graça e da inteligência. Não as concebo separadas.
Renascida das cinzas, Claudiane ressignificou sua vida e lhe foi presenteada uma filha, com quem vive hoje, realizada. Passadas cinco décadas, há mais o que agradecer e comemorar, pois todos os seus reveses resolveram lhe dar um tempo, um tempo para pensar e seguir em frente. Enfim, pode abraçar a graça que lhe foi dada, outra vez, desde quando nasceu no dia 21 de maio de 1970.
Exato um mês depois de seu nascimento, a Seleção Brasileira de Futebol se sagrava campeã pela terceira vez, com um dos maiores elencos de todos os tempos, capitaneados por Carlos Alberto, Gérson Jairzinho e Pelé, o Rei do Futebol. Em casa, a alegria foi dupla, sobretudo para meu pai, José Almeida Monteiro.
Em 1981, Claudiane me presentou com duas relíquias que ainda conservo envoltas num plástico, numa parte especial de uma das estantes da biblioteca. As revistas Super Mouse (Gatos Invisíveis) e Cacá e sua Turma. Eu estava na fase de letramento e o presente foi um grande estímulo para a leitura. Perdi a conta das vezes que sorvi cada historinha daquelas revistinhas em quadrinho, afinal, tínhamos algumas restrições financeiras na família e revistas eram um objeto de luxo. Abençoada seja a ideia que ela teve, a quem sou eternamente grato.
Repeti o gesto com meu filho Pedro Franklin e hoje ele tem dois baús e parte de nossa estante cheios de revistas em quadrinho e centenas de exemplares da Revista Recreio. O exemplo de Claudiane foi muito importante e hoje faço questão de multiplicá-lo com juros e correções monetárias. Anseio a hora de o mesmo ocorrer com Júlia. A leitura abriu inúmeras portas e janelas para mim e levou-me a singrar mares e mares de conhecimento, alicerce para a minha formação intelectual e para a minha profissão.
Na toada da vida, Claudiane aguçou e maturou a sensibilidade que lhe peculiar. Tem uma espécie de sexto sentido. Fortalecida, faz de sua casa seu porto seguro e tem uma âncora de sabedoria fincada na convivência familiar. Do seu parceiro e confidente, nosso caçula Claudimarx, aos sobrinhos, afilhados e alguns fieis amigos. Não ambiciona mais nada, além de viver e com saúde.
Funcionária pública municipal dedicada, longe dos holofotes dos cargos que lhe fizeram mal no passado e das más companhias, alcança o meio século de sua jornada, com aquele olhar que até hoje lhe é singular: “meio de lado, assim de banda”. Com uma diferença: ornado de um belo sorriso de vitória e de superação no rosto.