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DIÁRIO DE UMA QUARENTENA (Lázaro)
7 de abril de 2020 - 21:50, por Claudefranklin Monteiro
Não é novidade para ninguém, sobretudo para quem me conhece, que sou católico. Mas num dos momentos mais difíceis de minha vida, foi uma canção evangélica que me consolou e me ajudou a seguir em frente. Refiro-me ao dia 11 de maio de 2005. Há aproximadamente 15 anos. Naquele fatídico dia, uma das pessoas que mais amei nessa vida nos deixou de forma repentina. O professor José Cláudio Monteiro Santos, meu padrinho, meu irmão mais velho e minha principal referência nessa vida nos deixou com 51 anos de idade. Um vazio enorme tomou conta de mim e deseja que Jesus pudesse ressuscitá-lo, para que ele pudesse testemunhar o resultado de seu investimento.
Os dias de luto que se seguiram só tiveram alento quando, passando uma temporada na casa de meus sogros, Ranulfo e Lindete, enquanto nossa a nossa terminava de ser construída, uma canção no rádio me tomou de assalto e recobrou minhas energias: A Tempestade e o Sol (2003), da Banda Catedral, que foi composta por Júlio e Kim para homenagear o baterista do grupo, José Cezar Motta, falecido naquele ano num acidente automobilístico. Eu fui apresentado à banda anos antes, pelo meu amigo Antônio Vicente Celestino de Souza Bezerra, mas não dei muita importância por ser católico e só me permitir ouvir Padre Zezinho, por exemplo.
A música e a letra de Júlio e Kim caíram como uma luva para que eu pudesse dissipar e conviver melhor com os lutos. Digo, assim os lutos, porque sete meses depois, minha mãe, Claudemira, também nos deixava, aos 71 anos e pelo menos quinze deles numa cadeira de rodas. Por isso, no trecho da canção que diz: “Tenho certeza que vou te encontrar / Não sei o dia e a hora, mas sei o lugar / Sei que você está bem / Mesmo assim, isso não me impede de chorar”; eu sempre o faço no plural.
Doravante, para além de meu preconceito católico, tenho visto com muita atenção e entusiasmo a invasão positiva do cristianismo no ambiente musical do rock in roll, estilo geralmente atribuído e, também de forma preconceituosa e apressada, à coisa do diabo. Principalmente se considerarmos dois exemplares católicos do chamado rock de Jesus: Diego Fernandes e Rosa de Sharon. E no meio evangélico, além de Catedral, a Banda Oficina G3.
Tudo isso, e de modo particular, para falar de um personagem bíblico, nesses tempos de Semana Santa, pelo qual tenho grande fascínio. Estou me referindo a Lázaro, tão bem descrito e representado na canção da Banda Oficina G3, Eu, Lázaro, do CD Elektracustika (2007). A letra como um todo é uma narrativa muito precisa e preciosa, mas quero destacar uma passagem em especial “O amor derramado em lágrimas / A palavra que me traz a vida / Ecoa o som / A Tua voz o meu nome chamou / Veio aqui pra me buscar / Os meus sonhos não vão morrer”.
Mas afinal, sobre qual Lázaro eu estou escrevendo? Não é o da parábola de Jesus, em Lucas 16,19-31, que narra a história de um rico que foi para o inferno e pedia ao mendigo Lázaro, no paraíso, que fosse lhe molhar ao menos a ponta de seu dedo e lhe refrescasse a língua. A tradição cristã o transformou em São Lázaro, o Leproso, cujas iconografias se apresentam com muletas ou um cachorro a lhe lamber as feridas.
O Lázaro a quem me refiro era o de Betânia, amigo pessoal de Jesus, irmão de Marta e Maria, que segundo Ângela Cerinotti, autora do livro Santos e Beatos de Ontem e de Hoje: “(…) ocupa lugar de destaque no quarto Evangelho, em que o milagre da ressurreição prefigura e profetiza o Cristo” (2004, p. 19). Marta e Maria são aquelas mesmas que aparecem em Lucas 10, 38-42, onde uma cuidava de receber e agradar a Jesus em sua casa e a outra das obrigações diárias.
A belíssima passagem da ressurreição de Lázaro está narrada em João 11, 1-54. A primeira coisa que me chama a atenção é quando Jesus chega ao local onde Lázaro estava sepultado fazia três dias, no versículo 35 que diz: “Jesus chorou”. Ninguém chora à toa por outra pessoa. É a manifestação de um grande apreço e um grande amor, sobretudo naquela condição, de morto. E quando tudo parecia acabado, Jesus grita por Lázaro, que do túmulo retorna vivo, causando grande espanto e admiração, mas também temor entre os presentes, inclusive alguns de seus inimigos.
A voz de Jesus ecoa aos meus ouvidos e do fundo do túmulo de meu ser, onde habitam todas as minhas carniças e se putrefazem todos os meios defeitos e limitações, o ressoar firme daquele grande imperativo: “Lázaro, sai para fora!” (Jo 11, 43). Como nos diz a canção de Oficina G3: “Eu ouvi tua voz / Eu ouvi o meu nome”; eu, Lázaro; eu, Claudefranklin.