DOENÇA, MEDO E FÉ

17 de março de 2020 - 20:33, por Claudefranklin Monteiro

Com o avanço dos casos de pessoas infectadas ou mortas pelo novo corona vírus, em proporções pandêmicas, o medo se instala e o mundo dá um freio de arrumação, oportunamente importante, se a atitude for a de refletir e ressignificar a vida. Sim, precisamos, sob pena de ser exterminada a criação, a vida humana, repensarmos valores, atitudes e pensamentos. Pelo visto, inúmeros conflitos de proporções mundiais e outros casos semelhantes como os que agora estamos experimentando, não foram suficientes para frear e eliminar de uma vez por todas o orgulho, a vaidade, a soberba e a quimera de que somos e podemos tudo, sem limites e sem consequências.

O coronavírus (covid-19), doença detectada pela primeira vez na China, na província de Wuhan, foi considerado pela Organização Mundial de Saúde, uma pandemia. Inicialmente, era apenas uma epidemia, concentrada em um único lugar, agora, alcançou praticamente todas as partes do mundo. A cada dia, novos casos surgem, inclusive aqui em Sergipe, e já vem causando óbitos em vários lugares, a exemplo da Itália e do Iran, os casos mais preocupantes.

Como sabemos, não é de hoje que a humanidade é sacudida por doenças graves, por moléstias que causam graves males às pessoas, limitando-as, mutilando-os ou mesmo matando-as. Inúmeras foram as situações nesse sentido. Vejamos algumas delas, a nível de informação, mas também de aprendizagem para lidar com o coranavírus, que acima de tudo, exige que nos cuidemos.

Na Idade Média, entre os anos 1343 e 1353, a peste bubônica assolou boa parte da Europa e do Oriente, matando em torno de 50 milhões de pessoas. A doença, em grande medida, se deu em razão da flagrante falta de higiene das pessoas daquela época.

Na primeira metade do século XIX, entre 1817 e 1824, o grande flagelo da humanidade foi a cólera, doença ainda presente em nossos tempos e que à época deixou milhares de pessoas mortas. No final daquele século, foi a fez da tuberculose, chamada de “o mal do século”, que teria matado em torno de um bilhão de pessoas em todo o mundo.

No início do século XX, por volta de 1917, a gripe espanhola, uma variação do vírus Influenza (associado às gripes comuns e ao H1N1), deixou um rastro de morte assustador, entre17 e 100 milhões em escala mundial. Ainda no início do século XX, logo após a gripe espanhola, entre 1918 e 1922, um surto de Tifo vitimou mais de 3 milhões de pessoas.

 Do final do século XX, anos 80, até a presente data, o vírus do HIV, a Aids, já levou a óbito mais de 20 milhões de pessoas, incluindo artistas de renome nacional e internacional, tais como Renato Russo, Cazuza e Fred Mercury.

As doenças e moléstias estão presentes nos textos bíblicos e também nas profecias. Porém, as sagradas escrituras apontam para uma assertiva: a cura é a manifestação do amor de Deus. O princípio da cura é a fé: “Senhor, se queres, podes curar-me”. Disse o leproso para Jesus, em Mateus 8,2.

Em Tiago 5, 14-15, chama a atenção a seguinte passagem: “Entre vocês há alguém que está doente? Que ele mande chamar os presbíteros da Igreja, para que estes orem sobre ele e o unjam com óleo, em nome do Senhor. A oração feita com fé curará o doente; o Senhor o levantará. E, se houver cometido pecados, ele será perdoado”.

A doença e a cura estão presentes, também, no Salmo 103,3: “É ele que perdoa todos os seus pecados e cura todas as suas doenças”.

Em tempos quaresmais, vale a pena refletir sobre uma passagem do profeta Isaías, em 53,4: Certamente ele tomou sobre si as nossas enfermidades e sobre si levou as nossas doenças; contudo nós o consideramos castigado por Deus, por Deus atingido e afligido”.

Nesse sentido, seriam as doenças um flagelo de Deus, se Ele é amor? Não. As doenças são responsabilidade exclusiva da humanidade. A história mostra isso. Resultado da ignorância, da falta de higiene, do desregramento, do ódio, de guerras e suas armas, sobretudo biológicas. Mas do que maus espíritos que assolam as pessoas, mas do que exorcismos, as doenças precisam ser combatidas com inteligência e graça. À ciência, os cuidados necessários, e à fé, a graça da cura.

Nas palavras de Jesus há uma orientação muito clara, de modo particular para os creem nele e para os quais designou seus ensinamentos: “Curai os doentes, ressuscitai os mortos, purificai os leprosos, expulsai os demô­nios. Recebestes de graça, de graça dai!” (Mateus 10,8)

Ainda em Mateus 5,36, Jesus aponta para aquilo sobre o qual estamos ressaltando nesta reflexão em torno da relação ente doença, medo e fé. Ao dizer que “estive doente e foste me visitar”, Nosso Senhor aponta o caminho para a cura e para a libertação: o cuidado.

A ideia de cura e cuidado, de cuidar, sempre me inquietou, do ponto de vista cristão. Aprendi isso com a doença de meu sogro, acometido de um mal que também, como as pandemias, vem tirando a vida de muitas pessoas. Meu sogro lutou por menos de três anos com um câncer de pulmão. Ao vê-lo partir, no leito de hospital, ao ver a vida sumir de seus olhos, vi que é cuidado que nos liberta e cura. Ainda que ele não tivesse sido curado da doença, sou testemunha que ele foi curado da alma, sobretudo em razão do cuidado que sua esposa e filhas tiveram para com ele, sabendo elas o quanto era difícil e doloroso exercerem essa missão. De alguma forma, a morte de meu sogro, nos curou a todos e segue curando feridas abertas aqui e ali.

Entre setembro e novembro do ano passado, eu me submeti a duas cirurgias. Quero dizer a vocês que foi muito importante a assistência espiritual do sacerdote (no caso, Padre Valmir) e o apoio e orações de familiares e amigos. O amor de Deus, sua bondade e atenção se manifestam em nós em cada tempo que desprendemos pelo outro, de modo particular pelos mais necessitados, doentes e abandonados de toda sorte. Inclusive, descrentes do amor de Deus.

Mais do que medo e indiferença, precisamos de esperança e de solidariedade, de muita solidariedade. Se o beijo, o abraço, o aperto de mão, o ombro e o colo estão temporariamente suspensos, que a oração seja nosso alento, a preencher nossos corações de coragem e de amor fraternal. Só assim, seremos capazes de superar nossas limitações e aprendermos, de uma vez por todas, que precisamos cuidar uns dos outros, pois a vida é passagem e nisso a doença é mestra e doutora a nos ensinar ao longo da história.

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