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Léia Cassol: “Lagarto não é somente vaquejada e 7 de setembro”
28 de janeiro de 2018 - 20:02, por Marcos Peris
Portal Lagarto Notícias
A entrevista desta semana é com a escritora e contadora de histórias, Léia Cassol, que está passando uma temporada no município de Lagarto, realizado pesquisas sobre os costumes e tradições da gente de Lagarto. Natural do estado do Paraná, ela veio parar em Sergipe após conhecer as obras de Sílvio Romero.
Além disso, durante a entrevista, Léia Cassol, uma amante do folclore brasileiro, falou da sua carreira, das obras de Sílvio Romero, das impressões positivas e negativas que foi obtendo ao longo da sua estada e da importância de se preservar a cultura local.
Confira a Entrevista da Semana:
PLN: Como uma paranaense, que reside há 20 anos em Porto Alegre, veio parar na cidade de Lagarto?
LC: Eu gosto muito de folclore, tanto que conto histórias há 23 anos. Nesse período, realizei muitas pesquisas sobre a cultura e os hábitos populares, o quê me levou a Uninter São Paulo, onde ocorreu o Festival Internacional de Folclore. E foi lá que eu tive a oportunidade de conhecer alguns membros da Associação do Folclore de Lagarto (Asflag) e o Grupo dos Parafusos.
Depois disso, eu descobri que eles eram da mesma cidade, da cidade de Sílvio Romero, autor que leio há bastante tempo. Então, por fazer a amizade com eles e ter essa curiosidade de conhecer a cidade, acabei vindo para cá, sendo muito bem acolhida pelo mestre dos Parafusos.
PLN: Quando foi que a escritora descobriu o seu talento para a literatura infanto-juvenil?
LC: Quando eu era pequena, meu pai me contava muitas histórias populares e muitas delas eram coletadas por Sílvio Romero, mas somente depois de um tempo de estudo foi que consegui localizar isso. E o fato dele contar histórias, me fez ter esse gosto por esse mundo encantado. O interessante é que não eram histórias de livro, mas história de boca.
Eu somente fui conhecer os livros quando fui à escola, daí eu comecei a ler muito mesmo. Lia demais. E quando fui morar no Rio Grande do Sul, acabei trabalhando por acaso em uma editora de livros, onde o pessoal percebeu meu encantamento por eles, me retirando do setor administrativo e enviando-me para as escolas, para realizar uma feira de livros. Então, enquanto não tinha criança nessas feiras, eu lia esses livros. Lia tudo! Quando eles chegavam, eu contava as histórias a fim de deixa-los curiosos. Mas de tanto contar as histórias dos outros, eu decidi contar as minhas.
Então comecei a escrever, fui à editoria, publiquei meu primeiro livro e em março completarei 15 anos nessa área.
PLN: Qual dos seus livros merece destaque? Por quê?
LC: O primeiro, porque ele é um livro regional, que se passa em Porto Alegre, e que conta uma história de amizade entre o Beto e a Fê. A partir dai surgiu a coleção Beto e Fê. Mas o mais interessante é que ele ainda é o mais vendido, sendo que foi lançado no dia 7 de março de 2003.
PLN: Quando iniciou os estudos sobre Sílvio Romero?
LC: Eu comecei a estuda-lo em 2002, quando comecei na Faculdade de Letras, justamente, por conta dessa minha curiosidade sobre o folclore, porque eu contava histórias e também porque a professora havia me indicado: Câmara Cascudo e Sílvio Romero. Os dois maiores folcloristas que nós temos de contos populares.
Então eu comecei a lê-los e me encantei pelo Sílvio Romero, por causa das cantigas e das coisas que ele registrou, principalmente, daqui do estado de Sergipe. Tudo isso me passou despercebido, embora eu conhecesse a vida dele, não me toquei que ele era de Lagarto. Eu me ocupava mesmo da obra dele e de tudo que ele registrou. Mas parece que nada é por acaso, porque eu vim parar na cidade dele. Então as coisas vão acontecendo e a gente vai aproveitando.
PLN: Sílvio Romero é um tanto polêmico. Diante disso, das obras que leu, há alguma crítica?
LC: Ele é polêmico, mas também tem muitas coisas teóricas. Porém, eu procuro me ater às coisas que ele coletou sobre o nordeste e Sergipe, principalmente. Eu gosto muito das pesquisas sobre ele, porque eu vim para cá. Então é muito legal eu saber que ele fala do Oiteiros, que já conheci, por exemplo, que hoje eu sei o que é. Então aquele conhecimento deixou de ser teórico para ser uma experiência e isso é muito legal.
PLN: Acredita que o povo de Lagarto não valoriza ou desconhece a riqueza que ele deixou?
LC: Acredito que desconhece essa riqueza. Esse é um trabalho de educação patrimonial que tem que ser feito nas escolas, porque a gente não pode amar, valorizar e cuidar aquilo que não se conhece. Então o ato de preservação cultural começa lá na base com a educação patrimonial. Por isso, acredito que o trabalho de educação patrimonial fosse realizado, para que despertasse o gosto nas crianças para que elas pudessem conhecer, se sentirem parte daquilo e ter orgulho de dizer: “Eu sou da cidade do Sílvio Romero”. Isso poderia acarretar não somente na valorização, mas também no surgimento de novos escritores.
PLN: Pensa em voltar a morar na região Sul do Brasil, em definitivo?
LC: Eu moro lá e cá, mas em definitivo eu queria ficar aqui. Porém, é lá que eu ganho dinheiro, pois meus negócios e minha empresa estão tudo por lá. Aqui eu consigo desenvolver as minhas pesquisas e tal, mas não é nem 10% do que eu faço lá, nas escolas.
Aqui o pessoal é mais resistente e parece que o trabalho de contar histórias tem que ser gratuito, mas isso é meu ganha pão. Pedem para que eu conte uma história, eu recomendo adotar os meus livros, ai dizem que já escolheram e ai o que vou fazer? Isso é uma troca. Em 2017, eu divulguei bastante o meu trabalho, mas esse ano eu já decidi que temos que fazer uma parceria que seja boa para todo mundo. Eu tenho que sobreviver.
PLN: Como as pessoas conhecem o seu trabalho?
LC: Eu já viajei vários estados brasileiros, porque gosto muito de conhecer. Mas as pessoas geralmente conhecem o meu trabalho através de alguma indicação. Pelas redes sociais, as pessoas só conhecem, mas depois de uma indicação, eles compram o meu trabalho.
PLN: O que Lagarto tem de especial?
LC: As pessoas. Elas são muito receptivas, muito gratas por você está aqui. Em qualquer lugar que eu vá, as pessoas são muito gratas por você parar e conversar com eles. Por isso, acho que essa simplicidade das pessoas faz muita diferença.
PLN: O que a escritora ainda não se acostumou na cidade de Sílvio Romero?
LC: Coentro, que é muito forte para o meu paladar. Uma vez que lá no sul, a gente não tem coentro. Não tenho nada contra ele cozido, mas ele cru a sala, porque quando pica o coentro e bota em tudo, para mim fica tudo com gosto de coentro. O cheiro é forte, tanto quando entro num restaurante, o primeiro cheiro que sinto é o do coentro. Então somente isso que não me acostumei e acho que nem vou me acostumar. Fora isso, tudo bem.
PLN: Qual comida típica você gostou mais?
LC: Eu gostei muito da Maniçoba, do Arroz com Galinha e da Tripa Assada. Eu já comi de tudo, mas o que adoro mesmo é Jaca. Jaca dura.
PLN: E como tem sido postar essas comidas nas redes sociais, o que para nós é algo simples demais?
LC: Tudo isso começou quando postei um vídeo de uma amiga que me convidou para comer a Maniçoba, sendo que eu já tinha comido. Eu pensei que ela faria somente pra gente, mas não, ela faz para vender. Então gravei o vídeo e ele teve mil visualizações em dois dias, fora os comentários. Por isso, vi ali uma boa oportunidade, porque isso valoriza o meu passe quando eu for contar as histórias. Não será nada embasado em teoria, mas em experiências vividas por mim mesma. Eu conheço a Quadrilha São João, os Parafusos, então sei do que estou falando e isso é muito importante para mim.
PLN: Qual mensagem você deixa para os leitores do Lagarto Notícias?
LC: Que amem a sua cidade, que ouçam as histórias e que passem-nas para os seus filhos. Quem tem avô e avó vivos que pergunte como eram as coisas. Isso é de uma riqueza tão grande. Por isso, não deixem as suas tradições morrerem. Lagarto não é somente vaquejada e 7 de setembro, Lagarto tem muita coisa nos povoados. Eu vejo que há um grande desconhecimento e, justamente por isso, não há o cuidado de passar adiante.