Cassiano: “Eles deixaram de dizer: ‘Filho cuidado!’ E passaram a dizer: ‘Você consegue!”

24 de janeiro de 2016 - 12:58, por Alexandre Fontes

Cassiano Santana - 21 anos

Cassiano Santana – 21 anos

A entrevista da semana é com o lagartense de coração que não teve medo de sonhar alto, que mesmo sem as devidas condições não desistiu dos seus objetivos. Ele já percorreu vários lugares de mundo e até conheceu o presidente da NASA, bem como, a pré-candidata à presidência dos EUA Hillary Clinton.

 

Cassiano Santana, de apenas 21 anos, é mais um exemplo vivo de que através da educação pode-se sonhar alto, e sem medo de cair.

O garoto estudou o ensino fundamental no Escola Estadual Don Mário Rino Sivieri, cursou o ensino médio no Instituto Federal de Sergipe campus Lagarto, é um jovem embaixador e aluno de uma das maiores universidades dos Estados Unidos, a Papson College.

 

Lagarto Notícias: Quem é Cassiano Santana?

Cassiano: Eu tenho 21 anos, nasci em Itabaiana, mas toda a minha parte de educação foi aqui em Lagarto, então me considero lagartense porque foi através da educação que eu pude ir além e conquistar coisas maiores. Eu diria que sou um sonhador porque nasci com os pés no chão, mas vivo com a cabeça na lua, sempre sonhando com coisas altas, coisas que a maioria da população e as outras pessoas ao meu redor diriam que são impossíveis, e eu comecei muito jovem desde os 8 ou 10 anos já falava muita besteira nesse sentido. Acho que em si, eu sou uma daquelas pessoas bem sonhadoras, bem visionarias e, de certo modo, muito bem motivada naturalmente. Além disso, sou uma pessoa que gosta muito de ter o reconhecimento, ultrapassar limites e se sentir útil.

 

LN: Não é fácil ser um jovem embaixador, mas como surgiu esta sua pretensão?

Cassiano: Sempre falo que o Programa Jovem Embaixador foi o embrião de tudo, porque no dia 19/02/2009 quando eu estava assistindo a Record e, eles estavam fazendo uma entrevista com os jovens embaixadores daquele ano e eu vi que todos ali eram de escola pública, de origem humilde, que aprendeu o inglês fluente, que participava ativamente da sociedade em que viviam, eram bons estudantes. Então eu disse que tinha que participar disso, e eu não falava uma palavra em inglês, e o inglês fluente era uns dos principais requisitos… na reportagem eles dizia que foram 6 mil candidaturas e apenas 27 foram selecionados, mas eu vi que teria quatro anos para conseguir a aprovação e depois daquele dia, como a minha família não tinha condições de pagar um cursinho de inglês, todo santo dia, quando eu chegava da escola, ia estudar inglês. Eu, literalmente, aprendi a falar inglês sozinho. Eu tentei consegui uma bolsa aqui em Lagarto, mas disseram que só poderiam me dar uma bolsa parcial, daí eu resolvi estudar sozinho com o computador da minha irmã. Em seguida, eu tentei a seleção e no primeiro ano não consegui, no segundo, a embaixada falou que eu tinha o perfil, mas que tinha que melhorar meu inglês, daí eles me mandaram pra Recife. Essa foi a minha primeira quebra de estereótipo, eu quis e não estava me importando com a quantidade que seria selecionado no Brasil, apenas me dediquei.

 

LN: Em todos os desafios há muitas dificuldades, quais foram as dificuldades que você encontrou?

Cassiano: Quando as pessoas me diziam que eu não iria conseguir, eu buscava conseguir. Me diga que eu não consigo, que eu vou te mostrar que consigo. Eu tive muitas dificuldades, o primeiro não que eu consegui, fiquei triste, mas não desisti. Sabia que eu o mundo que eu estava entrando exigia muito de mim porque eu chegava, ia para os programas, e via pessoas com história extremamente motivadoras, daí eu pensava que iria melhorar muito para chegar àquele patamar. Então eu sempre aprendi com as dificuldades e, eu tinha que melhorar porque o selecionado era aquele que era demais. Eu sempre usei as dificuldades como um impulso, sempre sonhei alto e sem limites, olhava as dificuldades e aplicava mais esforço. Sempre vi a minha vida como um jogo de xadrez: se eu consegui fazer os movimentos corretos e, conseguir pensar como que cada decisão na minha vida vai influenciar no meu futuro, então eu consigo planejar muito bem o meu futuro de uma forma mais adequada. Por isso tenho um plano daqui a cinco anos que é flexível, mas está estabelecido. Acho que você tem que estabelecer objetivos e alternativas porque se você receber um não, você terá uma alternativa que poderá ser melhor que a principal.

 

LN: Antes de seguir a carreira de embaixador, qual a sua perspectiva de futuro?

Cassiano: Eu sempre pensei em ser médico porque sempre me dei bem com as matérias de biologia, antes de pensar na carreira de diplomata, a primeira coisa que pensei foi em ser médico. Entrar numa federal e seguir medicina. Mas isso tudo mudou depois que conheci os jovens embaixadores, depois que comecei a ver outras possibilidades de carreira e foi quando decidi ser diplomata, mas me desconectei deste objetivo porque vi que há muitas nuances que eu não gostaria de participar dentro da carreira diplomática. Eu prezo muito pela meritocracia, então se algo para mim não é meritocrático, não vou conseguir colocar a minha energia.

 

LN: No seu histórico você desenvolveu vários projetos e trabalhos voluntários antes de ser selecionado para o cargo, mas claro houve muito estudo. Como foi o seu preparo para chegar onde chegou?

Cassiano: Eu sou motivado naturalmente, não preciso ter nada em troca para ser motivado. Acho que em termos de estudos, eu sempre fui muito competitivo, não que eu queira sempre ser o melhor, mas que se eu não vencer, então que eu coloque alguém muito melhor do que eu, senão, não conseguirei dormir à noite. A minha cabeça é meio equivocada, se houver uma prova e eu não me sentir preparado, eu não vou conseguir dormir. No que se refere a estudos, eu sempre tive muita facilidade em aprender, não preciso decorar, eu leio as coisas e as interpreto rapidamente, e já está na minha mente. Sou um pouco obstinado por ter tudo planejado na minha vida, e os estudos é a parte essencial, quando estudava no IFS dormia pouco, costumo dormir pouco porque tenho na minha mente que: se eu dormir muito, os meus competidores vão tá se desenvolvendo muito melhor do que eu. Por isso, sempre dormi pouco, o resto do dia eu ficava estudando e, por mais que as pessoas digam que estou perdendo a juventude, acho que são pouquíssimos jovens que, no ensino médio, fizeram o tanto de viagem que fiz. E viajar para mim é a coisa mais linda que existe. Embora essas viagens não fossem a turismo, elas me permitem conhecer um mundo que os meus colegas não conheceriam tão cedo e que eu já estava ali através da Unesco, do MEC… porque eu me preparei para estar ali.

 

LN: Você já viajou para quantos países?

Cassiano: Quatro aqui da América do Sul e dois da América do Norte, além de todos os estados brasileiros, através do parlamento juvenil enquanto estava no ensino médio.

 

LN: Viver fora da sua terra natal não é fácil, mas como foram os seus primeiros dias nos EUA?

Cassiano: Moro nos EUA há 3 anos e trabalho dentro da universidade. Acho que assim como no Jovens Embaixadores, foi muito tranquilo porque temos uma assessoria extremamente eficiente, então não houve nenhum tipo de adaptação nesse sentido. Talvez quando fui para a família hospedeira, porque a adaptação maior ocorre quando você vai para a família hospedeira e quando vai para a escola. O período de maior adaptação foi esse, ter que me adaptar ao estilo da família americana, que tenho muito contato, e a escola. Na escola, eu fui advertido porque peguei muita matéria de história, porque gosto da disciplina, fazer amigos foi difícil. Lá, eu era muito crítico com as minhas notas e comecei pegando aulas muito avançadas para o meu tipo de inglês… já estava competindo com os americanos numa sala, onde só tinha eu de brasileiro. Para mim, não só o idioma era novo, mas também as aulas, as vezes eu não conseguia ler o que eles mandavam porque as aulas são discursivas, esse tipo de ensino foi o mais difícil de se adaptar. Então acho que a maior dificuldade foi na escola de ensino médio, nessa primeira etapa da minha vida em que estava participando de um ambiente acadêmico em inglês e é diferente falar inglês e ir para um ambiente acadêmico, é um nível de complexidade muito alto. Eu busquei aprender ao ponto de os professores falarem: “Não, aquele menino com a camisa do Brasil é muito bom”. Literalmente, eu cheguei no meu segundo semestre com os professores já me conhecendo, afirmando que disseram que eu era muito bom em debate de história, e isso me deixou muito feliz. A adaptação foi difícil, mas gerenciável.

 

LN: Quando você percebeu que poderia voar muito mais alto?

Cassiano: Foram etapas, aos poucos. Acho que cada plano que eu conseguia realizar, eu pensava maior e acho que falo dos Jovens Embaixadores com muita veemência porque antes mesmo de entrar no programa, no consulado em Recife, o pessoal me falou de um outro programa, o Education Your Save, que organiza os processos seletivos para ingressar nas universidades americanas e lá, eles começaram a listar os jovens embaixadores que conseguiram ingressar nessas instituições. Então eu vi aquela apresentação, me cadastrei no programa e, foi a primeira vez que eu quis ir pros EUA e morar lá era o meu sonho mais alto a ser conquistado. Mas a inscrição [do processo seletivo] era 8 mil, não tinha esse dinheiro, mas a Daniela me disse que o programa bancaria tudo e me daria as orientações e materiais necessários, enfim… Eu sempre tive essa de sonhar muito alto, talvez o que eu falava quando criança era mais sonhos um pouco mais abstratos, no ensino médio já eram objetivos bem concretos, com um determinado prazo e com um determinado objetivo. Mas acho que foi quando eu comecei a estabelecer e a ter a disciplina necessária para conseguir alcançar os meus objetivos. E tenho uma tradição que é de fazer uma avaliação do meu ano, então eu sempre penso que tenho que conseguir algo maior esse ano, para que ele seja melhor do que o anterior. E graças a Deus, todo ano é melhor que o outro, isto se deve porque estabeleci objetivos críticos.

 

LN: Você conheceu pessoas influentes da política americana, a exemplo da pré-candidata à Casa Branca Hillary Clinton, qual o maior ensinamento que eles transmitiram?

Cassiano: Todos os Jovens Embaixadores tiveram um encontro com a Hillary Clinton no Departamento de Estado e foi ótimo. A gente tomou um café da manhã com o pessoal do alto escalão do Departamento de Estado Americano e só passamos 30 minutos com ela, até porque ela é uma pessoa muito ocupada. E a mensagem dela foi a de: Aproximar os links entre a juventude do Brasil e a Juventude dos Estados Unidos a partir desse intercâmbio de ideias, de conhecimentos e aprendizagens em todos os níveis, desde o médio a nível universitário. Ela falou muito desse intercâmbio cultural e do nosso papel como jovens, de promover mudanças cada vez maiores dentro da sociedade. Que a gente tinha o poder de corrigir o que as gerações anteriores não puderam alcançar ou corrigir de maneira alguma. Depois a gente teve uma reunião com o presidente da NASA, e foi muito engraçado porque ele deu uma palestra de uma hora e ninguém sabia quem ele era porque lá eles chamam o presidente de “Director”, e nós achamos que ele era alguém do alto escalão da NASA, mas depois eu joguei o nome dele no Google e apareceu que era o presidente da NASA. Ai eu disse: “O quê? A gente estava com o presidente da NASA e ninguém percebeu isso?” (Risadas), depois perguntei se alguém sabia quem ele era e diziam que era apenas um diretor, daí eu expliquei que ele era o SEAL. Mas, durante a conversa, ele foi super humilde, falou de física, da Amazônia, confessou que o lugar mais bonito e que ele gostava de ver do espaço era o Brasil.

 

LN: Quais os seus próximos planos? Pretende algum dia vim morar no Brasil?

Cassiano: Tudo que eu queria para esse ano de 2016, eu já consegui. Já consegui ser aprovado nos processos seletivos que queria e, nesse ano vou estagiar lá na Falconi, que é uma das maiores consultorias de empresas do Brasil, depois disso, passarei dois meses em Londres fazendo estágio na área de finanças, na London school economicsque é uma das melhores escolas de finanças da Europa, então para esse ano já tenho tudo programado e de todos os meus quatro meses de férias de verão, só terei uma totalmente livre. No segundo semestre farei uma aula no exterior, no Chile, em Barcelona e depois espero conseguir um estágio num grande banco de investimentos dos EUA em Wall Street. Estou mirando estágio na área de investment banking, que trabalha na avaliação financeira da empresa quando ela quer expandir ou fazer fusões, aquisições, reestruturações e toda essa parte financeira mais complexa. E planejo em 2017, após esse estágio, retornar para a empresa como um Full Time, que nada mais é do que um funcionário efetivo.

Voltar pro Brasil, inicialmente eu não pretendo porque o que estou aprendendo é totalmente focado no mercado americano e inglês. Então estou pensando em permanecer nos EUA, mas como o visto de trabalho é concedido via loteria, o que é mais difícil, pretendo abrir as portas na Inglaterra porque se não der certo no Estados Unidos, já terei abrido as portas em Londres, que é dona do segundo maior mercado financeiro do mundo. Talvez retornar ao Brasil daqui a uns 10/15 anos, para voltar ao Brasil, só voltaria no cargo de executivo de alguma multinacional, ou abrindo a filial de alguma delas no país, que ainda é um mercado a se desenvolver.

 

LN: Qual a sua maior alegria?

Cassiano: Acho que a minha maior alegria, talvez seja, o que escrevi na minha redação principal para as universidades dos Estados Unidos, na qual dissertei sobre como eu mudei, e como mudei a mentalidade da minha família em relação aos meus sonhos. Porque a minha família sempre foi muito receosa com o que eu falava, meus pais diziam: “Olhe, não sonhe tão alto porque você pode se frustrar, porque a vida é complicada, é difícil e a gente não tem tantas condições assim”, e meus pais tinham medo de me verem frustrado e na mente deles tudo que eu falava era impossível e fora da nossa realidade. Então a minha maior alegria foi modular a mentalidade da minha família para que eles acreditassem nos meus sonhos e no final, quando estava esperando o resultado de Papson [Universidade Americana], lembro que falei aos meus pais que achava que não iria conseguir e, eles responderam “Ah não! Você sempre fala isso, diz que não vai conseguir, mas você sempre consegue dar um jeito”, e isso ouvir isso foi a minha maior alegria. Eles deixaram de dizer: “Filho cuidado!” e passaram a dizer: “Dá teu jeito, acredite nos seus sonhos, você consegue!”.

 

LN: Pode-se dizer que, além de ser um orgulho para sua família, também és um orgulho para Lagarto. Como você observa isto?

Cassiano: Eu me sinto muito feliz e isso para mim é bom porque eu gosto muito de inspirar as pessoas, eu gosto de, meio que, ser um espelho. Me vem um sorriso instantâneo quando alguém chega para mim e diz: “Ah caramba! Eu vi a sua história e, eu consegui isso por causa de você”, e muitas pessoas, que estudaram comigo no colégio, vem conversar comigo e pergunta se eu sei de alguma oportunidade, algum processo seletivo, de alguma experiência acadêmica ou profissional. Acho que fui o pioneiro na minha escola, de traçar esse caminho diferenciado, mas eu não fui o único e, isso me deixa muito feliz porque depois que consegui tudo isso no exterior, outras pessoas conseguiram feitos, também, grandiosos.

Para mim o aspecto mais positivo em ser reconhecido aqui em Lagarto é que outras pessoas possam conhecer a minha história, se inspirar e dizer: “Eu também posso ir longe e não importa a minha realidade atual!”.

 

LN: Hoje, com as políticas públicas de inclusão na educação adotadas pelo governo, muitos jovens voltaram a sonhar, mas muitos deles desistem diante dos obstáculos. Qual a mensagem que gostaria de deixar para os jovens deste pais, em especial, os jovens de Lagarto?

Cassiano: É justamente essa de sonhar alto. Acho que o esforço necessário para sonhar baixo, é o mesmo esforço necessário para sonhar alto, mesma coisa. Começa com o sonho e a imaginação, depois o que diferencia mesmo é a disciplina, a sua determinação de conseguir aquilo que você tá sonhando. E ai tem muita gente que sonha, sonha, sonha e não realiza. Tem gente que sonha, sonha e não aplica nenhum esforço para conseguir o que tá pensando, então isso não é sonho, é um delírio porque se é sonho, você tem que se comprometer completamente. “Eu quero, eu posso, eu consigo”, essa frase é curta, mas exige muito esforço. Acho que o principal, é primeiro sonhar alto e o que vai diferenciar é o nível de disciplina.

Com Marcel Telles (mantenedor da bolsa de estudos de Cassiano nos EUA)

Com Marcel Telles (mantenedor da bolsa de estudos de Cassiano nos EUA)

De Lagarto para o mundo

De Lagarto para o mundo

Xingó Parque Hotel & Resort

O Xingó Parque Hotel & Resort está situado perto da usina hidrelétrica Xingó e dos famosos cânions do Velho Chico, a 77 km do Aeroporto Paulo Afonso. Tudo isso, às margens do Rio São Francisco no município sergipano de Canindé. 

 

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