Subvenções: Entenda por que os deputados estaduais da legislatura passada violaram a legislação eleitoral

17 de novembro de 2015 - 12:18, por Marcos Peris

A Procuradoria Regional Eleitoral em Sergipe (PRE/SE), se prepara para os julgamentos das ações nos processos contra os deputados estaduais da legislatura de fevereiro 2011 a janeiro 2015. Em outubro, foram entregues as 24 alegações finais dessas ações eleitorais. Durante o processo, a PRE demonstrou que os deputados cometeram conduta vedada ao distribuir verbas de subvenção a entidades em ano eleitoral.

O Tribunal Regional Eleitoral de Sergipe agendou o julgamento das primeiras ações para os próximos dias 19 e 20 de novembro. Na quinta (19/11), a partir das 14h, será analisado o caso do deputado Antônio dos Santos. Já na sexta (20/11), a partir das 8h, serão julgadas as ações contra Arnaldo Bispo, Conceição Vieira e Augusto Bezerra.

Segundo o artigo 73, parágrafo 10, da lei eleitoral, “No ano em que se realizar eleição, fica proibida a distribuição gratuita de bens, valores ou benefícios por parte da Administração Pública”. A exceção é nos casos de calamidade pública, de estado de emergência ou de programas sociais autorizados em lei e já em execução orçamentária no exercício anterior, o que não foi o caso dos seis parlamentares em questão.

Conforme defendido pelo Ministério Público, a lei foi totalmente desrespeitada, pois todos os deputados, no ano eleitoral, decidiram, por meio de emenda individual, realizar a distribuição gratuita de valores, consistente nas denominadas “verbas de subvenção”, sem que estivesse aparado por quaisquer das exceções legais, tendo ocorrido “mera doação aleatória de dinheiro público, cujo ‘critério’ é, única e exclusivamente, o arbítrio de cada deputado na escolha das entidades agraciadas”.

A PRE apontou em sua manifestação que o Tribunal Regional Eleitoral de Santa Catarina, ao julgar situação idêntica, decidiu que “O repasse de subvenção pelo município a entidades privadas para custear sua manutenção, bem como propiciar a realização de eventos culturais e esportivos, configura distribuição de valores do erário vedada pelo parágrafo 10 do artigo 73 da Lei n. 9.504/1997, especialmente quando ausente prova de atendimento a programa social previamente instituído por lei, com execução orçamentária iniciada no exercício anterior ao da eleição”. Tal decisão foi mantida pelo Tribunal Superior Eleitoral.

O Ministério Público defendeu que a conduta dos deputados, independentemente de qualquer destinação eleitoral eventualmente dada às verbas de subvenção, interfere gravemente no processo eleitoral no Estado de Sergipe, afastando qualquer eficácia da vedação trazida na lei eleitoral e conferindo previamente aos parlamentares estaduais a possibilidade de influência no pleito mediante os repasses de recursos financeiros a entidades privadas em todo o território sergipano, influência essa caracterizada pela indiscutível e desmedida vantagem aos deputados estaduais que concorressem à reeleição ou àqueles candidatos por eles apoiados, em detrimento dos demais concorrentes.

Assim, o simples fato de cada parlamentar possuir, à sua livre disposição, valor superior a um milhão de reais para distribuir, aleatoriamente como visto, em pleno ano eleitoral, certamente traz grande influência no pleito – prova disso é o resultado das eleições de 2014, em que a imensa maioria da Alese ou “herdeiros políticos” de seus integrantes foram vitoriosos.

De acordo com o Tribunal Superior Eleitoral, para configurar a conduta vedada, não é necessário demonstrar o uso eleitoreiro da distribuição dos bens e valores. Basta apenas comprovar a prática do ato ilícito pelo agente público, devendo esse ser punido pelo descumprimento da proibição, independentemente de qualquer uso eleitoral direto. Caso isso ocorra, terá praticado também a infração eleitoral prevista no art. 73, inciso IV, da Lei nº 9.504/1997.

Além disso, contrariamente ao que vem afirmando a defesa dos deputados, os valores distribuídos não estão à disposição da presidente ou do 1º secretário, mas de cada deputado individualmente, que tem R$ 1,5 milhão para utilizar da forma que bem lhe prouvesse, indicando as associações que, a seu exclusivo juízo, deveriam ser beneficiadas com verbas de subvenção, e especificando o respectivo valor dentro de sua cota.

A própria emenda individual assinada pelos deputados traz em seu texto uma ordem de distribuição e a relação das entidades por ele beneficiadas. Assim, uma vez inseridas as emendas individuais no orçamento, cabia aos dirigentes e diretores da Alese, aí incluídos também a diretora financeira e a chefe do Núcleo de Controle, o mero ato burocrático de fazer a transferência bancária dos valores à associação.

A responsabilidade individual dos deputados foi confirmada pelas testemunhas ouvidas na Justiça, a exemplo da senhora Maria de Lourdes da Mota, diretora financeira da Alese, que confirmou nunca ter observado qualquer participação da presidente ou do 1º secretário no sentido escolher as entidades em nome dos outros deputados ou de negar algum pagamento, além de afirmar que cada parlamentar decidia livremente quais associações seriam beneficiadas por sua cota e também atuavam para que os pagamentos fossem feitos. Ou seja, se algum deputado tivesse decidido não distribuir dinheiro em ano eleitoral, não teria praticado a conduta vedada, pois o ato de decisão questionado – a emenda individual – era dele.

Em suas alegações finais, destaca o Ministério Público a grande dificuldade que teve para conseguir as referidas emendas individuais, necessárias para relacionar cada deputado às entidades por ele beneficiadas, tendo obtido tais documentos apenas após a realização de busca e apreensão autorizada pelo TRE na sede da Assembleia Legislativa, uma vez que a presidência da Casa afirmava, a todo o tempo, que as emendas individuais não existiam.  E mais, entre o material apreendido, foi recolhido um servidor de informática cuja Polícia Federal, após realizar perícia, verificou o apagamento de mais de 3.000 arquivos relacionados ao tema “subvenção”.

Segundo o procurador regional eleitoral Rômulo Almeida, “os dirigentes da Alese não tem qualquer participação e/ou interferência na escolha das entidades e na distribuição dos valores constantes da emenda individual dos parlamentares – estes atuam com completa independência em relação ao presidente e ao 1º secretário –, e, dentre a previsão orçamentária para gastos com verba de subvenção, não existe qualquer dotação específica para a presidência ou para a 1ª secretária da Assembleia. No caso, a situação dos ocupantes desses últimos cargos é exatamente idêntica à dos outros deputados – possuem a prerrogativa de destinar R$ 1,5 milhão para entidades assistenciais”.

Ele também acrescentou que a mera condição de ordenador de despesa não atrai automaticamente a responsabilização pela prática de conduta vedada, devendo haver efetiva participação no ato questionado. Caso a tese da defesa prosperasse, a presidente e o 1º secretário poderiam responder criminalmente e pela prática de ato de improbidade administrativa em razão qualquer desvio de verba pública de associações beneficiadas por outros deputados, mesmo não tendo interferido na confecção das emendas individuais desses parlamentares.

Pela conduta vedada descrita, a legislação estabelece como punições a suspensão imediata da conduta; multa que pode chegar a R$ 106.410,00 e cassação do registro ou diploma, sendo que em situações em que não se visualizar uma maior gravidade da prática irregular pode ser possível a exclusão da pena mais grave – a cassação do registro ou do diploma.

Nos casos dos deputados ou ex-deputados processados, a Procuradoria Regional Eleitoral entendeu que a exclusão da penalidade de cassação, diante das provas que foram produzidas, somente seria cabível nos processos de Antônio dos Santos, Arnaldo Bispo, Antônio Passos, Ana Lúcia Vieira, Conceição Vieira, Francisco Gualberto e Garibalde Mendonça, contra os quais se pediu a aplicação da multa prevista na lei em seu valor máximo – R$ 106.410,00.

Nos demais casos foram requeridas todas as penalidades, de multa e cassação do diploma, com perda do mandato e consequente inelegibilidade por oito anos para os deputados reeleitos. São eles Capitão Samuel, Adelson Barreto, Augusto Bezerra, Jefferson Andrade, João Daniel, Gilson Andrade,  Gustinho Ribeiro, Maria Mendonça, Luiz Mitidieri, Paulinho das Varzinhas, Venâncio Fonseca, Zezinho Guimarães e Mundinho da Comase (Suplente).

No caso dos deputados que não foram reeleitos ou não se candidataram, a PRE pediu ao Tribunal o reconhecimento da gravidade da conduta, e de que essa seria merecedora da cassação de diploma (caso, evidentemente, eles tivessem sido eleitos). Se o TRE aceitar a tese do Ministério Público, tal reconhecimento tem como consequência, segundo decisões do Tribunal Superior Eleitoral, a inelegibilidade dos ex-deputados pelo prazo de oito anos. Se enquadram nessa condição Suzana Azevedo, Angélica Guimarães, Zé Franco e Zeca da Silva. (PRE/SE)

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